segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

BULLYNG E AS PROPOSTAS LEGISLATIVAS

Pesquisando sobre bullying, achei interessante postar informações sobre no que consistiria esta prática, bem como sobre como tem se portado o Estado na busca pela disciplina desta conduta. 

O site http://www.portalbullying.com.pt/ demonstra ser uma ferramenta importante na divulgação de informações sobre o assunto. Segue abaixo texto disponibilizado naquela página sobre o tema:

O QUE É O BULLYING?

É um termo introduzido por Dan Olweus quando pesquisava sobre tendências suicidas em jovens adolescentes. As suas investigações levaram-no a concluir que a maioria dos jovens que cometiam estes actos, tinham sofrido algum tipo de ameaça.

É um Sub tipo de violência escolar; traduz-se num conjunto de comportamentos agressivos, intencionais e repetitivos, levados a cabo por um ou mais alunos contra outro. Manifesta-se através de insultos, piadas, gozações, apelidos cruéis, ridicularizações, entre outros.

É uma forma de pressão social que acarreta muitos traumas na vida dos alunos que diariamente convivem com esta realidade, fazendo com que, muitas das vezes, condicionem o seu quotidiano às solicitações dos agressores.

Na maioria dos casos há um comprometimento por parte das vítimas como forma de evitar novas retaliações, conduzindo assim, a situações anómalas, já que a obrigatoriedade do silêncio faz com que a maioria dos comportamentos sejam evidenciados pelos efeitos dos danos desta pressão no rendimento escolar, por sintomatologia psicossomática, por fobia escolar, depressão.

Na dinâmica Bullying alguém sofre de maneira directa as consequências da agressividade dos outros – a vítima. Este tipo de violência difere de outros devido à sua forma; é um comportamento agressivo intencional, repetitivo e evoca um desequilíbrio de poder (entre vítima e agressor) que se vai agravando com o passar do tempo e mediante a repetição dos actos.

É mediante estes acontecimentos que quem é continuamente agredido faz uma leitura pessimista da sua capacidade para lidar com a situação, levando a que se favoreça a sensação de perca de controlo sobre a sua própria trajectória de vida e liberdade.

LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE BULLYING

Embora não haja lei federal que trata da matéria de forma específica, vários estados e municípios brasileiros já sancionaram leis disciplinando a prática do bullying em suas cincunscrições. No Congresso Nacional tramitam várias proposições legislativas sobre o assunto.

Segue abaixo link, no qual se pode ter acesso ao conteúdo do Projeto de Lei de autoria da Deputada Federal Sueli Vidigal que dispõe sobre o desenvolvimento de política “antibullying” por instituições de ensino e de educação infantil, públicas ou privadas, com ou sem fins lucrativos.

PARA ACESSAR, CLIQUE AQUI!

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

DICAS SOBRE PETIÇÃO INICIAL

A. Dicas Gerais

1. Nunca se alongue demais.
2. Caso seja necessário escrever algumas laudas, quer para descrever os fatos, quer para explicar o direito em jogo, deixe claro cada ponto, abrindo itens e subitens e até intitulando cada um deles.
3. Fuja do gongorismo e de alusões estranhas, metáforas esdrúxulas, trocadilhos etc.
4. No uso de ironias, muito cuidado: para ser irônico há que ser fino, sutil; caso contrário é sarcasmo grosseiro. Na dúvida não use esse artifício.
5. Seja sintético.
6. Se a questão envolver contratos, recibos, títulos etc., eles devem ser citados na parte dos fatos.
7. Se se tratar de fato que tenha pessoa para testemunhar, diga o nome dela desde já e o que ela estava fazendo no local.
8. Sempre que possível, coloque as datas e os horários dos eventos.
9. Da Constituição Federal e das leis federais, transcreva apenas o essencial.
10. Se se tratar de lei estadual, municipal ou de portarias, circulares etc., é sempre importante transcrever a(s) norma(s) que interessa(m).
11. Se for caso de norma de difícil busca (lei municipal, portaria etc.), junte cópia do texto como documento e faça referência na peça. No documento grife o(s) artigo(s) que interessa(m), de preferência com caneta marca-texto amarela, laranja etc.

B. Aspectos Formais

1. Dirija a petição à vara sem número ou à vara específica quando o juízo for único.
2. Ações propostas diretamente no Tribunal são dirigidas ao Presidente do Órgão ou ao Relator, caso se trate de ação incidental.
3. Indique sempre a qualificação das partes. Caso não conheça algum dado (por exemplo, estado civil ou profissão), coloque "profissão desconhecida", "estado civil desconhecido" etc.
4. Indique claramente o tipo de ação e não a confunda com procedimento (ver modelos).
O correto é "Ação de Indenização pelo rito ordinário", e não "Ação Ordinária de Indenização".
5. Deixe, também, claro quando o pedido for, por exemplo, cumulado: "Ação de Rescisão Contratual cumulada com indenização por Perdas e Danos, pelo rito ordinário".
6. Se houver pedido de antecipação de tutela (ver mais elementos no item C, "infra"), abra item para pleitear expressamente.
7. Se houver pedido de liminar (ver mais elementos no item D, "infra"), abra item para pleitear expressamente.
8. Não esqueça do pedido (ver mais elementos no item E, "infra"). Abra item específico para o pedido.
9. Não esqueça de requerer a citação do réu e dizer como a quer (quando possível): pelo correio, por oficial de justiça etc.
10. Proteste por provas (ver modelos).
11. Se se tratar de procedimento sumário, não esqueça de apresentar o rol de testemunhas na própria peça. E, se for pleitear perícia, apresente, também, os quesitos e seu assistente técnico (ver modelos).
12. Coloque o valor da causa (ver modelos e item E.4, "infra", sobre o dano moral).
13. Junte documentos essenciais, assim como procuração e guia de custas recolhidas.
14. Se não tiver ainda o instrumento de mandato, proteste pela juntada. Faça o protesto na própria exordial.
15. Se se tratar de pedido de assistência judiciária gratuita, afirme a pobreza na própria peça (ver modelo). Abra item específico e destacado.

C. Antecipação de Tutela

1. Se pretende a antecipação de tutela, abra um item específico para pleiteá-la.
2. Apresente as razões para sua concessão.
3. Demonstre que estão presentes os requisitos legais.
3.1 Apresente a prova inequívoca da alegação. Diga qual é e aponte o número do documento anexo que a demonstre.
3.2 A alegação tem de ser verossímil. Logo, deixe claro(s) na peça o(s) ponto(s) alegado(s). Não se alongue. Seja claro e sucinto.
3.3 Demonstre que, se não for concedida a tutela antecipada, o dano que o autor sofrerá será irreparável ou, ao menos, de difícil reparação.
3.4 Os requisitos dos itens 3.1, 3.2 e 3.3 são os previstos expressamente na lei. Vale a pena referi-la. Coloque: "art. 273, 'caput' e inciso I, do CPC".
3.5 A outra hipótese para a concessão de tutela é a do inciso II do mesmo artigo. Nessa caso, então, indique o abuso de direito praticado pelo réu na sua defesa ou o seu manifesto propósito protelatório. Faça referência expressa ao inciso II do art. 273 do CPC.
4. Vale a pena aqui apontar um ou dois casos de concessão de antecipação de tutela pelos Tribunais para casos semelhantes.
5. Demonstre especificamente os danos que o autor sofrerá caso a antecipação não seja concedida.
6. Peça expressamente o deferimento da antecipação de tutela.

D. Liminar

1. Se pretende a concessão de liminar (ver modelos de cautelar, mandado de segurança, reintegração de posse), abra um item específico para pleiteá-la.
2. Apresente as razões para sua concessão.
3. Demonstre que estão presentes os requisitos legais.
4. Abra item para deixar claro o "fumus boni iuris".
5. Abra item para deixar claro o "periculum in mora".
6. Intitule os itens com os termos latinos "fumus boni iuris" e "periculum in mora".
7. Demonstre especificamente os danos que o autor sofrerá caso a liminar não seja concedida.
8. Vale a pena aqui apontar um ou dois casos de concessão de liminar pelos Tribunais em casos semelhantes (mas sempre quando não for questão corriqueira - ver Dicas Gerais, acima).
9. Peça expressamente o deferimento da liminar.
10. Se o caso exigir, ofereça caução para que a liminar seja concedida (ver modelo).
11. Abra, então, item tratando da caução. Especifique o bem oferecido e junte documento comprobatório da propriedade.

E. O Pedido

1. Abra item específico para o pedido.
2. Faça o pedido expressamente (nunca implícito, tácito ou subentendido).
3 Quando não for caso de pedido genérico (ver item 4, abaixo), apresente o pedido certo, exato, claro (ver modelos).
4. No pedido genérico, lembre-se: ele não é aleatório, abstrato ou indeterminado. Ele pressupõe a certeza do gênero (por exemplo, pedido de indenização por danos morais; pedido de indenização por danos materiais no que respeita à parte do valor a ser pago ao hospital quando o autor ainda está internado etc. - ver modelos).
5. Se o pedido é alternativo, deixe claro que é um ou outro.
6. Quando se tratar de caso com, por exemplo, prestações periódicas, deve-se fazer o pedido expressamente (ver modelos).
7. Quando o pedido for cumulado, peça todos expressamente.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Traição virtual cometida por cônjuge internauta dá causa à separação do casal


Marcelo Santoro Almeida*

Há muita discussão acerca da existência ou não de traição por meio da internet. A rede de computadores que veio para facilitar a vida das pessoas tem causado enormes preocupações em esposas e maridos de internautas. Isso porque, protegidos por uma "máscara" de segurança, ou seja, do anonimato, ficam até altas horas da madrugada, em chats (salas de bate-papo) e sites de relacionamento, conversando com estranhos.

Assim como em diversas situações sociais novas, essa também veio relacionar-se diretamente com as questões inerentes ao Direito de Família. Alguns especialistas alegam que tal fato poderia ser considerado como "traição"; outros profissionais já acreditam que seria uma evolução nas formas de relacionamentos, considerando que "umas horinhas" em um chat até alivie o estresse das relações conjugais.

Primeiramente, para entender da melhor maneira os fatos, cabe esclarecer quais são os deveres dos cônjuges no casamento, incluindo também os companheiros nas uniões estáveis: fidelidade recíproca, coabitação e sustento, mútua assistência e guarda e educação dos filhos em comum.

Quando uma pessoa entra em uma sala de bate-papo ou site de relacionamento, obviamente tem interesse em manter contato com outras pessoas, da mesma forma como se estivessem em uma festa ou em um local público, apenas com uma pequena diferença: o contato é virtual. Por meio de apelidos, criam um personagem próprio, um super-herói sem defeitos, o chamado príncipe encantado.

Na verdade, no ambiente virtual não estão lá o "Marcos" e a "Maria", mas um personagem por eles criado. E, após alguns minutos, alcançam determinada intimidade um com o outro que chegam até a praticar o "sexo virtual", se é que sexo pode ser realizado desta forma.

A grande dúvida nessa questão é: quando se pratica o "sexo virtual", está sendo praticado adultério? Essa é a pergunta que milhares de pessoas fazem no mundo.

O crime de adultério foi retirado do Código Penal pela 11.106, de 28 de março de 2005, mas antes disso já estava em desuso, seja pela evolução social, seja pela dificuldade de caracterização - há a necessidade de apanhar o "adúltero" na prática do ato sexual, uma situação quase impossível. Mesmo que ainda fosse comum a aplicação da pena e fosse fácil provar o crime, ainda assim, o internauta não o praticaria, visto que há necessidade de consumação do ato sexual propriamente dito, ou seja, do contato físico entre ambos.

Porém, algumas considerações merecem ser tecidas com relação à possibilidade de pretender a separação por culpa do "traidor internauta".

Geralmente, o internauta busca as salas de bate-papo ou sites de relacionamento de madrugada ou no período noturno, quando chega em casa logo após o trabalho. Nesses casos, a pessoa concede ao computador ou a alguém do "outro lado" mais atenção do que à família. Muitas vezes, deixa de praticar o sexo com o próprio cônjuge para praticá-lo virtualmente.

O conceito de mútua assistência como dever dos cônjuges no casamento é amplo, e não inclui somente a assistência material, mas também a moral e a psicológica, como apoio nos momentos difíceis, diálogo e tudo o mais que seja necessário ao sadio desenvolvimento do casal. Assim, ao varar as madrugadas grudado na tela do computador, o internauta deixa de prestar a assistência moral ao seu cônjuge, dando ensejo à propositura da separação por sua culpa.

O débito conjugal ou prática do ato sexual com o companheiro, também não pode ser negado, sob pena de ser decretada a culpa pela ruptura dos laços conjugais. Essa é uma das provas mais difíceis nas questões relacionadas ao Direito de Família.

Já a "traição" virtual em si seria causa para o decreto da separação por culpa do internauta? Sim, por um motivo óbvio: a traição virtual é uma injúria grave praticada contra o cônjuge inocente e torna insuportável a vida em comum da mesma forma que uma traição por telefone ou até mesmo física.

Neste caso, a prática do ato sexual não é fator fundamental para o requerimento da separação. Se fosse assim, não se poderia pretender a ruptura dos laços conjugais quando um dos cônjuges apenas flerta com outra pessoa ou "fica" com ela, o que seria um verdadeiro absurdo, pois é inegável que houve injúria grave.

A prova da traição pode ser adquirida por meio dos diálogos que permanecem no computador. Assim, é perfeitamente possível a busca da intervenção do Estado, a fim de ser decretada a separação do casal por culpa do cônjuge internauta.

* Especialista em Direito de Família e Sucessões, graduado em Direito pelas Faculdades Integradas Candido Mendes, professor de Direito da Faculdade Moraes Junior - Mackenzie Rio e do Centro Universitário da Cidade, além de autor de diversos artigos nas áreas de Direito de Família e Sucessões.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

STJ DECIDE


Direito à reparação por dano moral é transmissível aos herdeiros

Ainda que o direito moral seja personalíssimo – e por isso intransmissível –, o direito de ação para buscar a indenização pela violação moral transmite-se com o falecimento do titular do direito. Portanto os seus herdeiros têm legitimidade ativa para buscar a reparação. No caso, os herdeiros de um juiz de direito pleiteavam a habilitação na ação de indenização proposta por ele, ação que a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou procedente.

A ação de indenização foi ajuizada pelo juiz de direito após ter sido alvo de “graves ofensas” contidas em representação apresentada por uma empresa ao Ministério Público de São Paulo – resultando na determinação de abertura de procedimento penal pela Polícia Civil. As ofensas ao magistrado foram feitas após sentença condenatória desfavorável à empresa.

O pedido de reparação foi julgado procedente pelo juízo de primeiro grau. Depois do falecimento do juiz, os herdeiros requereram habilitação para figurar em seu lugar, no polo ativo da ação, pedido deferido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

A habilitação foi, entretanto, impugnada pela empresa, sob a alegação de que, por causa do caráter personalíssimo do direito moral, a transmissão da ação indenizatória aos herdeiros seria impossível.

Direito de ação
Porém, para a ministra relatora, Nancy Andrighi, o direito à indenização por violação moral transmite-se com o falecimento do titular do direito, ou seja, tanto os herdeiros quanto o espólio têm legitimidade ativa para ajuizar ação de reparação por danos morais. “O direito que se sucede é o de ação, de caráter patrimonial, e não o direito moral em si, personalíssimo por natureza e, portanto, intransmissível”, explicou a ministra.

Em outro ponto analisado no recurso, a empresa pedia a aplicação analógica do artigo 142 do Código Penal – que afirma não haver injúria ou difamação punível nas ofensas feitas em juízo (na discussão da causa) pelas partes ou procuradores.

No entanto, de acordo com a relatora, essa “excludente de antijuricidade pressupõe a existência de uma relação jurídica processual”, ou seja, a ofensa deve ter sido lançada em juízo, em momento de debate entre as partes, situação na qual “o legislador admitiu a exaltação de ânimos”. Além disso, o dispositivo não diz respeito às ofensas dirigidas ao juiz, uma vez que ele não é parte no processo.

Já o valor da indenização, alegado excessivo pela empresa, foi reduzido pela ministra Nancy Andrighi. Segundo ela, é evidente o exagero na fixação da indenização (correspondente a 15 meses de subsídios do juiz, valor que hoje superaria os R$ 300 mil), “tendo em vista que, para situações inegavelmente mais graves, como aquelas envolvendo a morte de um ente querido ou a existência de sequelas físicas”, o STJ não chega a valores tão altos. Dessa forma, a reparação por danos morais foi fixada em R$ 200 mil.

FONTE: STJ

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O Princípio da Actio Nata e o Superior Tribunal de Justiça

Tema que tem chamado a minha atenção, nos últimos tempos, “o princípio da actio nata, posto não traduza ideia propriamente nova, passou a ter uma aplicabilidade freqüente, com importantes efeitos práticos, na jurisprudência brasileira.


O seu estudo sempre esteve intimamente ligado à análise da “prescrição”, deitando raízes na vetusta expressão “actione non natae non praescribitur” (enquanto não nasce a ação, ela não pode prescrever), a teor do próprio art. 75 do Código Civil de 1916 (nesse sentido, cf. Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil - Parte Geral, volume I, 37ª edição, Saraiva, 2000).

Para a adequada compreensão do tema ora tratado, um importante registro merece ser feito. Diferentemente do entendimento vigente no passado, a doutrina e a jurisprudência modernas começaram a perceber – mormente após a entrada em vigor do art. 189 do Código Civil de 2002 - que, em verdade, o que prescreve não é a ação, e sim a pretensão(nascida de um direito à prestação violado).

Como não tenho espaço para desenvolver este raciocínio aqui, anoto um breve exemplo, para demonstrar a tese:

“CAIO (credor) é titular de um direito de crédito em face de TÍCIO (devedor). Nos termos do contrato pactuado, CAIO teria direito ao pagamento de 100 reais, no dia 01 de janeiro de 2002 (dia do vencimento).Firmado o contrato no dia 10 de dezembro de 2001, CAIO já dispõe do crédito, posto somente seja exigível no dia do vencimento. Observe, pois, que o direito de crédito nasce com a realização do contrato, em 10 de dezembro. No dia do vencimento, para a surpresa de CAIO, o devedor nega-se a cumprir a sua obrigação. Torna-se, portanto, inadimplente, violando o direito patrimonial de CAIO de obter a satisfação do seu crédito. Neste exato momento, portanto, violado o direito, surge para o credor a legítima pretensão de poder exigir, judicialmente, que o devedor cumpra a prestação assumida.Esta pretensão, por sua vez, quedará prescrita, se não for exercida no prazo legalmente estipulado para o seu exercício” (Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, Parte Geral, vol. 1, pág. 491).

Observe, pois, amigo leitor, que, mesmo após o transcurso do prazo prescricional (que, regra geral, é de 10 anos, a teor do art. 205, CC), o credor, embora desprovido de “pretensão”, ainda detém, obviamente “direito de ação”, pois, como se sabe, para a moderna teoria do processo, é assentado o entendimento de que o direito de ação é, simplesmente, “o direito de pedir ao Estado um provimento jurisdicional” e este direito, é forçoso convir, não prescreveria nunca!

Infelizmente, é comum ainda se ver, na doutrina e na jurisprudência, a referência à prescrição “da ação”, expressão que, como dito, data vênia, deve ser evitada, inclusive por força da própria norma legal em vigor:Art. 189, CC: Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206. (grifei)

Pois bem. A regra da “actio nata”, objeto de reflexão neste editorial, sustenta que um prazo prescricional somente começaria a correr quando o titular do direito violado tomasse efetiva ciência do prejuízo sofrido.Vale dizer, se o sujeito tem o seu direito violado, mas não toma conhecimento desta violação, o prazo prescricional não teria o seu curso iniciado.Alguns exemplos extraídos da jurisprudência do próprio STJ podem aclarar a hipótese:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRAZO PRESCRICIONAL.TERMO A QUO. ACTIO NATA. PRESCRIÇÃO CARACTERIZADA.1. O termo a quo do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado conta-se da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo, no presente caso, no momento que o servidor se inteirou da lesão cerebral, constatada no ano de 1970, quando então nasceu a pretensão (actio nata), assim considerada a possibilidade do seu exercício em juízo. Proposta a ação apenas em 1998, resta caracterizada a prescrição.2. Agravo regimental não provido.(AgRg no Ag 1392572/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/10/2011, DJe 06/10/2011)

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. RELAÇÃO ENTRE BANCO E CLIENTE. CONSUMO. CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO EXTINGUINDO O DÉBITO ANTERIOR. DÍVIDA DEVIDAMENTE QUITADA PELO CONSUMIDOR.INSCRIÇÃO POSTERIOR NO SPC, DANDO CONTA DO DÉBITO QUE FORA EXTINTO POR NOVAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO PRAZO PRESCRICIONAL PREVISTO NO ARTIGO 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL.1.  O defeito do serviço que resultou na negativação indevida do nome do cliente da instituição bancária não se confunde com o fato do serviço, que pressupõe um risco à segurança do consumidor, e cujo prazo prescricional é definido no art. 27 do CDC.2. É correto o entendimento de que o termo inicial do prazo prescricional para a propositura de ação indenizatória é a data em que o consumidor toma ciência do registro desabonador, pois, pelo princípio da "actio nata", o direito de pleitear a indenização surge quando constatada a lesão e suas consequências.3. A violação dos deveres anexos, também intitulados instrumentais, laterais, ou acessórios do contrato - tais como a cláusula geral de boa-fé objetiva, dever geral de lealdade e confiança recíproca entre as partes -, implica responsabilidade civil contratual, como leciona a abalizada doutrina com respaldo em numerosos precedentes desta Corte, reconhecendo que, no caso, a negativação caracteriza ilícito contratual.4. O caso não se amolda a nenhum dos prazos específicos do Código Civil, incidindo o prazo prescricional de dez anos previsto no artigo 205, do mencionado Diploma.5. Recurso especial não provido.(REsp 1276311/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/09/2011, DJe 17/10/2011)

E mesmo em face do especial prazo do mandado de segurança, cuja natureza jurídica é peculiar, existe entendimento do mesmo Tribunal:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. SUPRESSÃO DE VANTAGEM. DECADÊNCIA DA IMPETRAÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL.DATA DA EFETIVA SUPRESSÃO.1. O dies a quo do prazo decadencial para a impetração do mandado de segurança, ou do prazo prescricional para o ajuizamento da ação ordinária, dá-se na data da efetiva supressão da vantagem, sendo certo que nesse momento se origina a pretensão do Autor, segundo o Princípio da Actio Nata.2. Agravo regimental desprovido.(AgRg no REsp 1183516/AM, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 13/09/2010)

E, ainda, vale mencionar o elucidativo noticiário abaixo:

Mulher pode pedir indenização por erro médico em cirurgia realizada em 1979

Vítima de erro médico em São Paulo poderá pedir indenização por falha em cirurgia realizada em 1979. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao reconhecer que o prazo para prescrição do pedido de indenização por erro médico se inicia na data em que o paciente toma conhecimento da lesão, e não na data em que o profissional comete o ilícito.A paciente se submeteu a uma cesariana em janeiro de 1979 e, em 1995, foi informada de que havia uma agulha cirúrgica em seu abdômen. Até a descoberta, a mulher afirma que não sentia nada. Porém, em 2000, em razão de dores no corpo, teve a recomendação de extrair a agulha.O relator, ministro João Otávio de Noronha, esclareceu que deve ser aplicado o princípio da actio nata – no qual, o prazo prescricional para propor ação de indenização é contado a partir do conhecimento do fato. Nestes casos, o período de prescrição é de 20 anos”
Fonte: http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=448&tmp.texto=101667&tmp.area_anterior=44&tmp.argumento_pesquisa=actio%20nataacessado em 08 de novembro de 2011. 

Note-se que esta regra – de aplicação possível, em nosso sentir, até mesmo em face de certos prazos decadenciais - favoreceria sobremaneira a vítima do prejuízo sofrido, que não correria o risco de ver exaurido um prazo que sequer imaginou existir.

Todavia, é de suma importância que a sua aplicação seja revestida de redobrada cautela. Isso porque, se assim não o for, a referida regra poderá servir de incentivo àqueles que, cientes do efetivo prejuízo sofrido, quedaram-se silentes, por indolência ou má fé, seguros de que poderiam, no futuro e a qualquer tempo, voltar-se contra a parte adversa, transformando, assim, um louvável instituto protetivo, em um armamento soez de vingança.


PABLO STOLZE


DISPONÍVEL EM: http://pablostolze.ning.com/

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Exame de Ordem é constitucional

O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou nesta quarta-feira o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), prova que confere aos bacharéis em direito o registro de advogado, constitucional. Em julgamento do recurso extraordinário do bacharel em direito João Volante, de 56 anos, que pedia o direito de advogar sem a aprovação no exame, oito ministros já votaram em favor do exame.
 
O relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello, negou o recurso e explicou sua posição por mais de uma hora e meia. Ele rebateu um dos argumentos de Volante, de que o "exame não pode ser considerado só por si como qualificação profissional". "Qualificar-se não é apenas se submeter a sessões de teorias e técnicas, mas sujeitar-se aos testes. Se a prova não qualifica, as da faculdade também não. Elas seriam inconstitucionais?", questionou.
  
Para o ministro, o exame serve "perfeitamente" à função de avaliar se o bacharel tem condições mínimas para exercício da advocacia. "O perigo de dano da advocacia sem conhecimento serve para restringir liberdade de profissão? A resposta é positiva."
 
O ministro Luiz Fux, o mais novo no Supremo, seguiu o voto do relator e também negou o recurso. “Não se pode admitir que a atuação desqualificada aconteça para depois fiscalizar”, declarou Fux. O ministro destacou que é por intermédio do Exame de Ordem que se certifica que o bacharel está apto para o exercício da advocacia. “Apesar dos problemas do exame hoje não se pode falar em insconstitucionalidade.”
 
José Antônio Dias Toffoli seguiu o voto do relator sem mais comentários. A ministra Cármen Lucia afirmou que a OAB deve atualizar a forma de avaliar os bacharéis, "porque o direito muda" e também votou contra o recurso. Ricardo Lewandowski também votou junto com "o marvilhoso e irretocável voto do relator".
 
O ministro Carlos Ayres Britto afirmou que “a faculdade dá o direito ao diploma de bacharel. Para alcançar o plus é preciso o Exame de Ordem”. Na sequencia, Gilmar Mendes também defendeu “certa abertura social” para outros setores participarem da prova, mas negou provimento. “É da tradição brasileira e mundial que a formação em direito seja diferente da de advogado”, explicou.
 
O ministro Celso de Mello disse que desde o início do século 20 a corte já deixou claro que regulamentar uma profissão significa restringir. "Não é, portanto, qualquer profissão que se expõe a possibilidade constitucional de intervenção regulativa do Estado, pelo contrário. Vê-se pois que profissões, empregos ou ofícios que não façam instaurar perigos à vida, à saúde, à propriedade ou à segurança de terceiros não têm necessidade de requisitos mínimos. Isso já é mostrado aqui desde a década de 10 e 20 do século passado assim como recentemente, em pleno terceiro milênio, quando votada a regulamentação da profissão de jornalista.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

CASAMENTO HOMOAFETIVO

Rio Grande do Sul tem casamento entre duas mulheres
 
13/10/2011 | Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM
 
Depois de um ano e seis meses de união estável, duas mulheres do Rio Grande do Sul conseguiram converter a união em casamento. A decisão foi da 2ª Vara Cível de Soledade, do Rio Grande do Sul.

Segundo Delma Silveira Ibias, presidente da regional Rio Grande do Sul do Instituto Brasileiro do Direito de Família (IBDFAM/RS), "essa decisão é um avanço para o Direito de Família, pois todos merecem ter o mesmo tratamento. O Instituto já defendia, há muito tempo, a igualdade entre os sexos e agora tivemos mais esse reconhecimento. Outros casais homoafetivos vão querer regularizar suas situações, essa decisão é a primeira de muitas". Delma afirma que uma das requerentes passou a incorporar o sobrenome da companheira em seu nome e o regime do casamento foi comunhão parcial de bens.

O juiz José Pedro Guimarães se baseou na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu em maio deste ano a união estável entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. A partir dessa data, casais homoafetivos tiveram vários direitos assegurados como herança, pensão alimentícia, dentre outros.

Para marcar essa conquista, a oficial de registro civil de Soledade, Joana D'Arc de Moraes Malheiros, entregou à presidente do IBDFAM/RS uma cópia do primeiro pedido de conversão de união estável homoafetiva em casamento.

Tema de Congresso -
Para falar sobre o "Estatuto da Diversidade Sexual e as políticas inclusivas", o VIII Congresso Brasileiro de Família reunirá a advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do IBDFAM, o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis, e Walkiria La Roche, da Coordenadoria Especial de Políticas de Diversidade Sexual do Estado de Minas Gerais, no dia 15 de novembro, às 14 horas . O VIII Congresso será realizado entre os dias 13 e 16 de novembro, em Belo Horizonte. Inscreva-se em www.ibdfam.org.br/congresso.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

SANGUE VERSUS AFETO

Ação anulatória de Registro de Nascimento. Anseio do pai genético em ver revista a qualificação paterna no Registro da Criança
 
Tribunal Julgador: TJMG
 
Número do processo: 1.0624.06.010781-7/001(1)  Númeração Única: 0107817-53.2006.8.13.0624 
Processos associados: clique para pesquisar 
Relator:  Des.(a) VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE 
Relator do Acórdão:  Des.(a) VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE
Data do Julgamento:  30/08/2011
Data da Publicação:  23/09/2011 
Inteiro Teor:    

EMENTA: AÇÃO ANULATÓRIA DE REGISTRO DE NASCIMENTO - ANSEIO DO PAI GENÉTICO EM VER REVISTA A QUALIFICAÇÃO PATERNA NO REGISTRO DA CRIANÇA - ESTUDO SOCIAL - DEMONSTRAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO PATERNO-FILIAL ENTRE O PAI SÓCIO-AFETIVO E A CRIANÇA - PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DA MENOR - PROVIMENTO NEGADO. A filiação sócio-afetiva é aquela em que se desenvolvem durante o tempo do convívio, laços de afeição e identidade pessoal, familiares e morais. À luz do princípio da dignidade humana, bem como do direito fundamental da criança e do adolescente à convivência familiar, traduz-se ser mais relevante a idéia de paternidade responsável, afetiva e solidária, do que a ligação exclusivamente sanguínea. O interesse da criança deve estar em primeiro lugar, uma vez que é inegável que em casos de convivência habitual e duradoura com pessoas estranhas ao parentesco, o menor adquire vínculos de confiança, amor e afetividade em relação a estas pessoas. Esse vínculo não pode ser destruído por terceiro, mesmo que com base em laços sanguineos, se afronta os interesses da criança, colocando-a em situação de instabilidade e insegurança jurídica e emocional.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0624.06.010781-7/001 - COMARCA DE SÃO JOÃO DA PONTE - APELANTE(S): W.C.S.S. - APELADO(A)(S): I.L.P. E OUTRO(A)(S) - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE

ACÓRDÃO

(SEGREDO DE JUSTIÇA)

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador EDUARDO ANDRADE , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

Belo Horizonte, 30 de agosto de 2011.

DESª. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE - Relatora

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

A SRª. DESª. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE:

VOTO

Trata-se de recurso de apelação proposto à f. 79/83 por W. C. S. S, nos autos da ação Anulatória de Registro de Nascimento movida em face de I. L. P, M. C. P e M. H. C. P, no intuito de reformar a sentença de f. 75/77, que julgou improcedente o pedido inicial, nos termos do art. 269, I do CPC, ressaltando que deve-se privilegiar a paternidade afetiva sobre a biológica, uma vez que a menor não tem qualquer contato com o requerente e que ela está completamente adaptada ao meio em que vive.

Nas suas razões recursais, o apelante alega que o requerido agiu de forma ilegal e imoral ao registrar a criança mesmo sabendo que ela era filha do recorrente, fato comprovado pelo exame de DNA juntado nos autos. Assevera que a parte apelada teria sido incoerente no decorrer do processo, tentado por vezes ludibriar a Justiça, uma vez que restou demonstrado que o requerido tinha consciência de que a menor não era sua filha biológica desde o princípio da gestação. Afirma que em decorrência disso, deve o registro da criança ser anulado, por ter se caracterizado um vício insanável. Salienta por fim que houve falsidade no registro da criança, não estando ela apta a produzir qualquer efeito jurídico. Neste viés, requer seja dado provimento ao seu recurso, para reformar a sentença e anular o assentamento da menor.

Em contrarrazões à f. 86/89, alegam os apelados, em síntese, não prosperar as razões do apelante. Afirmam que a criança tem como seu pai o requerido, sendo notável o fato de que o vínculo biológico está cedendo lugar ao sócio-afetivo, pelo que deve ser mantida a r. sentença "a quo".

Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.

Inexistindo preliminares, passo ao exame do mérito.

O novo ordenamento jurídico estabeleceu como fundamental o direito à convivência familiar. Faz-se necessário reconhecer que a Constituição Federal legitimou o afeto, emprestando-lhe efeitos jurídicos. A partir daí, o afeto passou a merecer a tutela jurídica tanto nas relações interpessoais como também nos vínculos de filiação. A partir da Constituição de 1988, linhas fundamentais foram regulamentadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e projetaram-se no Código Civil de 2002, dando prevalência à paternidade afetiva e aos interesses primordiais da criança.

Instalada tal situação, em que há conflito entre os interesses do pai registral e afetivo e os do pai biológico, não se pode admitir, em regra, que o pai ou a mãe biológica venha requerer a anulação do registro em que consta outro pai, afrontando o interesse do menor e os princípios da razoabilidade e da segurança jurídica.

O art. 1.603 do Código Civil diz que a filiação se prova pela certidão do termo de nascimento (registro civil), podendo ser de filiação biológica ou não. Bastando apenas a declaração de vontade, sem qualquer demonstração de prova biológica.

A mesma lei infraconstitucional determina ainda, em seu art. 1.593, que:

Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consangüinidade ou outra origem.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, nos seguintes artigos, disciplina com intensidade os interesses do menor:

Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.

A Constituição Federal de 1988 assegura os direitos da criança e do adolescente e ainda ressalta a importância da família por meio dos arts. 227 e 229:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

Pode-se considerar a filiação sócio-afetiva como aquela em que se desenvolvem durante o tempo do convívio, laços de afeição e identidade pessoal, familiares e morais, envolvendo a constituição de valores e da singularidade da pessoa.

Esta paternidade é aquela que se sobrepõe aos laços sanguíneos decorrentes das alterações familiares da atualidade: desconstituição das famílias, pai que não assume a paternidade, adoção, entre outros. Na verdade, é aquela em que o pai não biológico passa a tratar a criança, no âmbito de uma família, como filha, criando-a e sendo responsável pela mesma.

Nesse sentido colho definição de Maria Berenice Dias:

"A filiação pode resultar da posse do estado de filho e constitui modalidade de parentesco civil de 'outra origem', isto é, de origem afetiva (CC 1.593). A filiação socioafetiva de manter a estabilidade da família, que cumpre a sua função social, faz com que se atribua um papel secundário à verdade biológica. Revela a Constancia social da relação entre pais e filhos, caracterizando uma paternidade que existe não pelo simples fato biológico ou por força de presunção lega, mas em decorrência de uma convivência afetiva.[...] certamente há um viés ético na consagração da paternidade socioafetiva. Constituído o vinculo da parentalidade, mesmo quando desligado da verdade biológica, prestigia-se a situação que preserva o elo da afetividade. Não é outro o fundamento que veda a desconstituição do registro de nascimento feito de forma espontânea por aquele que, mesmo sabendo ser o pai consangüíneo, tem o filho como seu." (DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 4.ed., rev.,atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2007.)

Em escrito publicado na Revista Brasileira de Direito de Família, encontra-se distinção entre genitor e pai:

"Pai é o que cria. Genitor é o que gera. Esses conceitos estiveram reunidos, enquanto houve primazia da função biológica da família. Afinal, qual a diferença razoável que deva haver, para fins de atribuição de paternidade, entre o homem dador de esperma, para inseminação heteróloga, e o homem que mantém uma relação sexual ocasional e voluntária com uma mulher, da qual resulta concepção? Tanto em uma como em outra situação, não houve intenção de constituir família. Ao genitor devem ser atribuídas responsabilidades de caráter econômico, para que o ônus de assistência material ao menor seja compartilhado com a genitora(...). Pai é aquele que cuida, educa, ensina, orienta, dá amor e carinho, brinca, leva à escola, etc.(...) A paternidade é múnus, direito-dever, construída na relação afetiva e que assume os deveres de realização dos direitos fundamentais da pessoa em formação à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar" (art. 227 CF). É pai quem assumiu esses deveres, ainda que não seja o genitor." (REVISTA BRASILEIRA DE DIREITO DE FAMÍLIA nº 01 - O exame de DNA e o princípio da dignidade da pessoa humana, p. 72).

Nota-se que a Constituição Federal de 1988 adota conceito aberto de paternidade, não permite a confusão entre genitor e pai, ou a primazia da paternidade biológica. Pelo contrário, à luz do princípio da dignidade humana, bem como do direito fundamental da criança e do adolescente à convivência familiar, traduz-se ser mais relevante a idéia de paternidade responsável, afetiva e solidária, do que a ligação exclusivamente sanguínea.

Neste mesmo sentido o STJ já decidiu:

RECONHECIMENTO DE FILIAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE - INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO SANGÜÍNEA ENTRE AS PARTES - IRRELEVÂNCIA DIANTE DO VÍNCULO SÓCIO-AFETIVO. (...) O reconhecimento de paternidade é válido se reflete a existência duradoura do vínculo sócio-afetivo entre pais e filhos. A ausência de vínculo biológico é fato que por si só não revela a falsidade da declaração de vontade consubstanciada no ato do reconhecimento. A relação sócio-afetiva é fato que não pode ser, e não é, desconhecido pelo Direito. Inexistência de nulidade do assento lançado em registro civil. O STJ vem dando prioridade ao critério biológico para o reconhecimento da filiação naquelas circunstâncias em que há dissenso familiar, onde a relação sócio-afetiva desapareceu ou nunca existiu. Não se pode impor os deveres de cuidado, de carinho e de sustento a alguém que, não sendo o pai biológico, também não deseja ser pai sócio-afetivo. A contrario sensu, se o afeto persiste de forma que pais e filhos constroem uma relação de mútuo auxílio, respeito e amparo, é acertado desconsiderar o vínculo meramente sanguíneo, para reconhecer a existência de filiação jurídica. Recurso conhecido e provido. (STJ - REsp 878941-DF - 3ª Turma - Relª. Minª Nancy Andrighi - Publ. em 17-9-2007)

Há também vasta jurisprudência deste Egrégio Tribunal:

Apelação cível. Ação declaratória. Maternidade socioafetiva. Prevalência sobre a biológica. Reconhecimento. Recurso não provido. 1. O art. 1.593 do Código Civil de 2002 dispõe que o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem. Assim, há reconhecimento legal de outras espécies de parentesco civil, além da adoção, tais como a paternidade socioafetiva. 2. A parentalidade socioafetiva envolve os aspecto sentimental criado entre parentes não biológicos, pelo ato de convivência, de vontade e de amor e prepondera em relação à biológica. 3. Comprovado o vínculo afetivo durante mais de trinta anos entre a tia já falecida e os sobrinhos órfãos, a maternidade socioafetiva deve ser reconhecida. 4. Apelação conhecida e não provida, mantida a sentença que acolheu a pretensão inicial. (Apelação: 1.0024.07.803827-0/001(1), Relator: Des. (a) CAETANO LEVI LOPES)

AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE C/C PEDIDO DE ANULAÇÃO DE REGISTRO DE NASCIMENTO - RECONHECIMENTO VOLUNTÁRIO ATO IRRETRATÁVEL - RELAÇÃO SOCIOAFETIVA COMPROVADA. SENTENÇA MANTIDA. - A anulação de registro civil de nascimento somente é possível se demonstrada alguma das hipóteses previstas no art. 171 do Código Civil de 2002. - A Lei não autoriza a postulação de declaração de estado ao contrário do que se verifica do registro de nascimento, salvo ocorrendo erro ou falsidade do registro. - Comprovada a socioafetividade entre pai e filho, não é possível a anulação do registro civil, tampouco a desconstituição de paternidade. (Apelação: 1.0024.05.872059-0/001(1), Relator: Des. (a) SILAS VIEIRA)

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE - EXAME DE DNA - PATERNIDADE SÓCIO AFETIVA. - Apesar do resultado negativo do exame de DNA, deve ser mantido o assento de paternidade no registro de nascimento, tendo em vista o caráter sócio afetivo da relação que perdurou por aproximadamente vinte anos, como se pai e filha fossem. (Apelação: 1.0105.02.060668-4/001(1), Relator: Des. (a) TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO)

No mesmo sentido já foi decidido nesta primeira câmara:

APELAÇÃO CÍVEL - BUSCA E APREENSÃO DE MENOR - PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DE MENOR AO PROGENITOR GENÉTICO - ESTUDO PSICOSSOCIAL - RECOMENDAÇÃO DE PERMANÊNCIA DO INFANTE NO AMBIENTE SÓCIO-FAMILIAR EM QUE ESTÁ INSERIDO DESDE TENRA IDADE - VÍNCULO AFETIVO CONSOLIDADO - INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE AUTORIZEM A CONCLUSÃO ACERCA DA CONVENIÊNCIA DA ALTERAÇÃO DA SITUAÇÃO ESTABELECIDA - PROVIMENTO NEGADO. Tratando-se de ação relativa à guarda de menores, o interesse e bem-estar destes devem nortear a tomada de qualquer decisão judicial. Se os elementos de convicção contidos nos autos demonstram que a criança está inserida no ambiente sócio-familiar em que vive, reconhecendo no atual guardião, ex-compaheiro da falecida genitora referências de afeto e autoridade, não há razões para alteração da situação, mormente se o estudo psicossocial elaborado por 'experts' apresenta conclusões nesse sentido. (Apelação: 1.0313.06.197097-3/001(1), Relator: Des. (a) ARMANDO FREIRE)

Importante frisar o Relatório do Estudo Social de fls. 59/63. Restou claramente demonstrado que há entre a criança e o requerido uma relação afetiva íntima e duradoura, caracterizada pela consideração frente a terceiros como se filha fosse.

É o que se constata:

"Observamos que os vínculos de efetividade e afetividade familiar estão fortalecidos desde o nascimento da M., com os membros do grupo familiar (que serão citados) bem como com os avós paternos (pais do I.). Tanto no dia da visita como no dia da entrevista , observamos que a menina é inteligente, educada, atenciosa, conversou conosco naturalmente."

"No dia da entrevista percebemos que ela ficava sempre próxima ao requerido, apresenta-se bem tratada, bem arrumada, limpa, alimentada, fala que sabe sua história de vida, ou seja, sabe que seu pai é W. referindo-se a ele pelo nome de C., mas afirma que não quer conviver com ele e com sua família, porque para ela, pai é o I., reconhece como parente apenas os familiares que convivem com ela desde o nascimento (a infância), ou seja, os familiares do I., refere-se a esses por vovó e vovô e seus irmãos, chama-os pelos nomes."

"Observamos que o requerido ao registrar a criança exteriorizou publicamente a consideração pela M. como filha. Percebemos que ele é pai da criança e zela pela criação, educação, ensinamentos, direciona e oferece suporte afetivo, além do material, há ainda, o tratamento mútuo de amor e respeito entre os familiares."

"Salientamos que o relacionamento do pai com a criança já se efetivou, consolidou-se para sempre."

No caso em tela, restou claramente demonstrado ser evidente a existência de uma relação paterno-filial entre o requerido e a criança, em que há o chamamento de filha e a aceitação do chamamento de pai, não sendo possível proceder a anulação do registro de nascimento da menor.

Não é demais lembrar que o interesse da criança deve estar em primeiro lugar, uma vez que, é inegável que em casos de convivência habitual e duradoura com pessoas estranhas ao parentesco, o menor geralmente adquire vínculos de confiança, amor e afetividade em relação a estas pessoas.

Vale salientar, entretanto, que apesar de não ser possível anular o registro de nascimento da criança neste momento, em função da paternidade sócio-afetiva, trata-se de direito imprescritível (ECA, art. 27) de a menor buscar o reconhecimento do pai biológico. A só existência do registro não pode limitar o exercício do direito de buscar, a qualquer tempo, o reconhecimento da paternidade. Assim, conhecendo o pai biológico e estando registrada como filha de outra pessoa, a criança não está inibida de intentar ação para alterar o seu registro futuramente, reconhecendo-se a sua ascendência.

Determina o Código Civil de 2002:

Art. 1606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz.

Art. 1.614. O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação.

Confira-se jurisprudência do STJ:

"Não se extingue o direito de o filho investigar a paternidade e pleitear a alteração do registro, mesmo quando vencido integralmente, depois da maioridade, o prazo de quatro anos. Precedentes da Segunda Seção. Recurso não conhecido." (Resp 208.788-SP, DJ 22/4/2003)

Assim, caso o menor, quando alcançar a maioridade assim o queira, poderá perseguir a sua real identificação, que não se confunde com a identidade, que é subjetiva.

Com tais considerações, nego provimento ao recurso mantendo na totalidade a decisão de primeiro grau.

Custas recursais pelo recorrente, verbas que permanecem em suspenso em razão do deferimento da gratuidade judiciária.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): ARMANDO FREIRE e ALBERTO VILAS BOAS.

SÚMULA :      NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

sábado, 8 de outubro de 2011

Abaixo o Juridiquês!

A comunicação escrita é a principal ferramenta de trabalho dos advogados e deve ser utilizada de maneira clara e convincente.
É fato que toda atividade profissional possui uma linguagem própria do setor, desenvolvida para auxiliar a comunicação entre os pares. Médicos, engenheiros, empresários e policiais têm em sua comunicação particular palavras, expressões e jargões desconhecidos dos leigos, mas que são importantes no contexto interno de cada área, para melhor expressar as ideias.

Na advocacia não poderia ser diferente. Por isso, palavras como doutrina, jurisprudência, contencioso, liminar e até expressões em latim como habeas corpus, ad hoc e modus operandi são necessárias no contexto dos processos judiciais. No entanto, além dessas palavras e expressões já consagradas ao longo do tempo, muitos advogados “recheiam” seus textos com termos que vão além da necessidade de comunicar uma ideia específica, gerando peças jurídicas que são verdadeiros desafios para os que precisam entender o exato teor dos argumentos, escritos ou orais, apresentados.

Assim, encontramos diversas peças jurídicas com expressões como: “exordial acusatória”, “consorte supérstite” e “excelso sodalício”, para denominar respectivamente os termos denúncia, viúvo e Supremo Tribunal Federal, como exemplifica o professor Virgilio de Mattos, da Escola Superior Dom Helder Câmara, em matéria publicada na revista Visão Jurídica.

Quando um advogado pergunta “Você já perlustrou os autos?”, ele está utilizando uma linguagem arcaica. Seria mais adequado se ele fizesse a pergunta usando a expressão “Você já leu o processo?”

O o exemplo mostrado por Claudio Moreno, mestre em língua portuguesa, e Túlio Martins, juiz de Direito e jornalista, no excelente livro “Português para convencer – comunicação e persuasão em Direito” (Editora Ática, 2006), ilustra bem a questão de linguagem inadequada na elaboração de textos jurídicos, em um parágrafo de petição:

Destarte, como coroamento desta peça-ovo, emerge a premente necessidade de jurisdição fulminante, aqui suplicada a Vossa Excelência. Como visto nas razões suso expostas com pueril singeleza, ao alvedrio da lei e com a repulsa do Direito, o energúmeno passou a solitariamente cavalgar a lei, esse animal que desconhece, cometendo toda sorte de maldades contra a propriedade deste que vem às barras do tribunal. Conspurcou a boa água e lançou ao léu os referidos mamíferos. Os cânones civis pavimentam a pretensão sumária, estribada no Livro das Coisas, na Magna Carta, na boa doutrina e nos melhores arestos deste sodalício. Urge sejam vivificados os direitos fundamentais do Ordenamento Jurídico, espeque do petitório que aqui se encerra. O apossamento solerte e belicoso deve ser sepultado ab initio e inaudita altera parte, como corolário da mais lidima Justiça.

“Por que nossa linguagem comum, tão cômoda e tão fácil, torna-se obscura e ininteligível quando empregada nos contratos e nos testamentos?”
Montaigne

Por mais estranho, e até de certa forma cômico, que possa parecer o texto apresentado, ainda hoje é possível encontrar esse tipo de redação nos processos judiciais. Acreditam os autores estar praticando uma comunicação escrita de alto nível, quando na verdade estão produzindo textos confusos que deixam tanto o Direito quanto os fatos em segundo plano.

Segundo Moreno e Martins, no exemplo citado, o advogado explica os fatos e justifica a necessidade de obter jurisdição de urgência para defender um proprietário que move ação contra um vizinho que invadiu uma parte de seu terreno, onde existe um córrego com água potável e um abrigo para vacas leiteiras. Pede liminarmente a reintegração da posse dizendo que houve violência e que a invasão se deu clandestinamente, e que isso está lhe trazendo crescentes prejuízos.

Como se vê, a questão é simples. No entanto, o advogado pode pôr tudo a perder por se expressar de forma inadequada. Os autores sugerem uma nova abordagem de redação para a mesma petição, mais clara e simples, em estilo moderno e mais adequado, como no exemplo apresentado a seguir:

Do que foi exposto acima, conclui-se que os fatos narrados nesta petição inicial são incontroversos e estão provados sumariamente por meio dos documentos aqui juntados. Tanto o Código Civil como a Constituição da República contêm regras claras que protegem a propriedade, observada sua função social – ou seja, exatamente a hipótese deste processo. Como nos ensina a melhor doutrina e a jurisprudência, o pedido em exame contém todos os elementos que determinam a concessão imediata da reintegração de posse: há interesse econômico, os fatos estão provados e o Direito do autor é indiscutível. A água potável existente no local está sendo poluída e as vacas leiteiras ficaram ao desabrigo, pelo que os prejuízos são evidentes. Assim, pede a concessão da liminar, por medida de Direito e de Justiça.

O exemplo citado demonstra que toda peça jurídica pode, e deve, ser escrita de forma a ser compreendida não apenas pelos operadores do Ddireito envolvidos no processo, mas também pelas partes, ou seja, pelos clientes dos respectivos advogados, muitas vezes pessoas de outras áreas profissionais como médicos, engenheiros e empresários, e até de pessoas simples, como donas de casa, mecânicos, e pequenos comerciantes que têm pouca ou nenhuma compreensão dos termos e jargões jurídicos, ou seja, do “juridiquês”. Aalguns deles não conseguem nem compreender alguns dos termos da procuração que assinam autorizando seus advogados a defender seus direitos.

Trazendo a questão da comunicação para o marketing jurídico e as relações comerciais dos advogados com o mercado, no processo de captação, conquista e fidelização de cliente, entendemos que uma comunicação clara, agradável e persuasiva pode fazer grande diferença para o sucesso do escritório. A linguagem deve levar em conta o nível de compreensão do público-alvo e jargões jurídicos devem ser evitados.

Alguns advogados têm escrito e publicado artigos informativos dirigidos ao seu público-alvo como ferramenta de marketing jurídico. Divulgação desses conteúdos na imprensa e na internet presta um grande serviço à comunidade, tirando dúvidas e sugerindo soluções para os problemas jurídicos do dia a dia. Ao mesmo tempo, os artigos publicados por advogados discutindo assuntos relevantes ajudam a promover sua marca e construir uma reputação positiva no mercado. No entanto, essa forma de praticar o marketing jurídico precisa levar em conta os conceitos apresentados anteriormente.

O uso de expressões e palavras só compreensíveis pelos operadores do Direito faz com que a mensagem não chegue de maneira adequada ao público- alvo ou que este perca o interesse de conhecer o teor do texto. Neste caso, a mensagem é inútil, pois o leitor desiste de compreender os textos se eles forem excessivamente rebuscados e técnicos.
Não somos contra a utilização da linguagem forense por parte dos advogados. No entanto, esse tipo de linguagem tem o momento adequado e deve sempre ser direcionado a públicos que sabidamente irão compreendê-lo. Aalém disso, o bom senso e o objetivo da comunicação devem sempre ser priorizados, tanto nas petições jurídicas como na comunicação direta com os clientes-alvo.
Acreditamos que na prática de uma advocacia moderna e eficaz o advogado deve privilegiar o sentido e o objetivo da comunicação, procurando expressar- se, seja por via escrita, seja por via oral, de forma clara, persuasiva e convincente, sem pedantismos, sempre levando em conta a capacidade de compreensão de seu público-alvo. Assim, o profissional do Direito estará sintonizado com o cliente e, ao mesmo tempo, será eficaz em sua prática jurídica. 
Ari Lima
Empresário, engenheiro, consultor, palestrante e especialista em marketing jurídico e gestão de escritórios de advocacia. www.arilima.com / arilima@arilima.com
* Colaborou Alexandrina Saldanha, bacharel em Direito e pós-graduada em produção e revisão de textos.

SUGESTÃO DE DOUTRINA

  • GAGLIANO, Plablo Stolze & PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil
  • CHAVES, Cristiano & ROSENVALD, Nelson. Direito Civil
  • MIRANDA, Pontes. Tratado de Direito Privado, tomos 1 a 4, Bookseller
  • GOMES, Orlando. “Introdução do Direito Civil”. Rio de Janeiro: Forense.
  • PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil
  • DIREITO CIVIL BRASILEIRO. Carlos Roberto Gonçalves. Editora Saraiva Volumes: 01 a 03.
  • DIREITO CIVIL. Silvio de Salvo Venosa. Editora Atlas. Volumes: 1 a 7.
  • CURSO DE DIREITO CIVIL. Maria Helena Diniz. Editora Saraiva. Volumes 1 a 7.
  • CURSO DE DIREITO CIVIL. Washington de Barros Monteiro. Editora Saraiva. Volumes: 1 a 6.
  • DIREITO CIVIL. Silvio Rodrigues. Editora Saraiva. Volumes: 1 a 7.

Mandamentos do Advogado

Eduardo Couture

ESTUDA - O Direito se transforma constantemente. Se não seguires seus passos, serás cada dia um pouco menos advogado;

PENSA - O Direito se aprende estudando, mas exerce-se pensando;

TRABALHA - A advocacia é uma luta árdua posta a serviço da Justiça;

LUTA - Teu dever é lutar pelo Direito, mas no dia em que encontrares o Direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça;

SÊ LEAL - Leal com teu cliente, a quem não deves abandonar senão quando o julgares indigno de ti. Leal com o adversário, ainda que ele seja desleal contigo. Leal com o Juiz, que ignora os fatos e deve confiar no que dizes;

TOLERA - Tolera a verdade alheia na mesma medida em que queres que seja tolerada a tua;

TEM PACIÊNCIA - O tempo se vinga das coisas que se fazem sem a sua colaboração;

TEM FÉ - Tem fé no Direito como o melhor instrumento para a convivência humana; na Justiça, como destino normal do Direito; na Paz, como substituto bondoso da Justiça; e sobretudo, tem fé na Liberdade, sem a qual não há Direito, nem Justiça, nem Paz;

ESQUECE - A advocacia é uma luta de paixões. Se a cada batalha, fores carregando a tua alma de rancor, dia chegará em que a vida será impossível para ti. Terminando o combate, esquece tanto a vitória como a derrota; e,

AMA A TUA PROFISSÃO - Trata de considerar a advocacia de tal maneira que, no dia em que teu filho te peça conselhos sobre o destino, consideres uma honra para ti propor-lhe que se faça advogado.